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A fiscalização trabalhista nos empreendimentos de economia solidária da Lei 15.068/2024
Uma análise sobre as características e requisitos dos EEEs e das dimensões da fiscalização trabalhista exercida em face deles
Existem cadastrados 27.472 empreendimentos de economia solidária (EES), beneficiando cerca de 1.807.060 milhão de pessoas físicas associadas e sócias e 36.956 de trabalhadores não-sócios, distribuídas em todo o território nacional, que desenvolvem uma extensa e expressiva variedade e quantidade de produtos e serviços.
A Lei Paul Singer resulta do Projeto de Lei 6.606/2019 e foi aprovada pela Câmara dos Deputados em novembro de 2024, após retornar do Senado Federal com alterações.
A principal modificação promovida pelo Senado foi a inclusão de mais um inciso no artigo 44 do Código Civil, que estabelece o rol de pessoas jurídicas de direito privado. Ela traz a definição das características dos empreendimentos de economia solidária, criando um sistema nacional para regulamentar e apoiar essas iniciativas, como adiante examinado.
Características dos EESs
Os EESs são definidos por características específicas que incluem (artigo 4º):
- Autogestão: os membros administram coletivamente as atividades econômicas e decidem sobre a partilha dos resultados de forma transparente e democrática, com voto singular para cada associado e sem dissociação entre propriedade e gestão típica dos empreendimentos genuinamente capitalistas (heterogestão);
- Participação direta: os membros estão diretamente envolvidos na realização do objetivo social da organização. (artigo 5º, IX);
- Comércio justo e solidário: a prática de comércio de bens ou prestação de serviços de maneira justa e solidária, suscetível de questionamentos judiciais em razão de em certas operações realizadas na ausência essas condições;
- Distribuição proporcional dos resultados: os resultados financeiros são distribuídos conforme a deliberação dos membros, proporcional às operações e atividades realizadas individual ou coletivamente; e
- Destinação do resultado operacional líquido: o resultado operacional líquido é destinado para alcançar as finalidades da organização, ajudar outros empreendimentos em situação precária e promover o desenvolvimento comunitário ou a qualificação dos integrantes.
Requisitos e classificação dos EESs
A forma societária não é um critério para o enquadramento como beneficiário da Política Nacional de Economia Solidária. O site do MTE informa que podem se inscrever no CadSol iniciativas de economia solidária coletivos informais, associações, cooperativas e sociedades mercantis, embora, desde a vigência do Código Civil de 2002, não mais existam sociedades civis e mercantis. As sociedades passaram a ser classificadas em sociedades simples e sociedades empresárias, na conformidade do artigo 982 do código.
O enquadramento como economia solidária não define o tipo de organização jurídica e corresponde a uma qualificação do Direito Administrativo outorgada a agremiações formais ou informais, para acesso a benefícios de uma política pública (artigo 9º), como acontece com organizações sociais (OS), organizações da sociedade civil de interesse público (OSCIP), objeto das Leis 9.637/98 e 9.790/99.
Empreendimentos econômicos solidários formalizados são classificados como pessoas jurídicas de fins econômicos (objetivam produção ou circulação de bens ou serviços no mercado) sem finalidade lucrativa. Ademais, o artigo 5º, § 4º, parece sugerir a preferência pelo tipo societário de cooperativa. É a sinalização de Paul Singer (“a cooperativa de produção é protótipo de empresa solidária”).[1]
Os grupos informais, por sua vez, não poderão receber outro tratamento legal senão de sociedades em comum dos artigos 986 a 990 do Código Civil. A consequência é não estarem cobertos pelo manto da pessoa jurídica (sem a autonomia jurídica e patrimonial plasmada nos arts. 45, 49-A e 1.022, do Código Civil).
Por fim, empreendimentos que atuam na intermediação de mão de obra subordinada não são beneficiários da Política Nacional de Economia Solidária. Então, a partir de uma interpretação menos restritiva, eles poderiam contratar empregados, mas não fornecer mão de obra a terceiros.
Os EESs formalmente constituídos seriam realmente nova espécie de pessoa jurídica?
A Lei 15.068/2024 acrescentou mais um inciso ao rol do artigo 44 do Código Civil, o qual elenca as pessoas jurídicas de direito privado, incluindo os empreendimentos de economia solidária.
Acima se viu que os EESs seriam uma qualificação administrativa, e não exatamente uma nova tipo de estrutura jurídica. Assim, a exemplo das organizações religiosas e partidos políticos, inseridos posteriormente na enumeração do artigo 44 do Código Civil em 2003, os EESs não seriam nova espécie de pessoa jurídica.
O caráter estatutário dotado de maior rigidez legal, previsão de órgãos distintos para a deliberação, administração e controle, vocação para atração de grandes investimentos (e não de trabalho) para gestão por terceiros em busca de lucro e sujeito a riscos, além da clara dissociação entre propriedade acionária e poder de comando empresarial, tornariam a sociedade por ações um tipo societário de difícil ou impossível utilização para os empreendimentos de economia solidária.
A sociedade limitada ainda ofereceria obstáculos a serem superados. A sociedade do tipo simples admite sócio de serviços e deliberação unânime para as alterações do contrato social.
Como a associação não admite a distribuição de resultados financeiros entre respectivos membros, resta o tipo societário cooperativa, que parece ser o mais indicado para os ESSs, como decorre da visão do próprio Paul Singer.
Objeto da fiscalização trabalhista dos EESs
A fiscalização trabalhista, frente às atribuições previstas no artigo 11 e incisos da Lei 10.593/2002, verifica não a regularidade do empreendimento de economia solidária em si ou se ele atende corretamente às características para inscrição do CadSol, e sim se admite ou mantém de alguma forma, em sua estruturação e divisão interna de tarefas, trabalhadores sob os requisitos concretos da relação de emprego (CLT, arts. 2º e 3º).
Isto porque a subordinação jurídica é nota típica da relação de emprego e, como afirmou Paul Singer, na economia solidária “não há capitalistas; não há capital, não há patrão e a característica fundamental: ninguém obedece porque ninguém manda.[2]
Convém não perder de vista que o próprio Supremo Tribunal Federal, na análise dos casos de pejotização e terceirização, pontuou a seguinte ressalva:
12. [...] Desse modo, são lícitos, ainda que para a execução da atividade-fim da empresa, os contratos de terceirização de mão de obra, parceria, sociedade e de prestação de serviços por pessoa jurídica (pejotização), desde que o contrato seja real, isto é, de que não haja relação de emprego com a empresa tomadora do serviço, com subordinação, horário para cumprir e outras obrigações típicas do contrato trabalhista, hipótese em que se estaria fraudando a contratação. (destaques acrescidos).[3]
Nessa perspectiva, a fiscalização do trabalho ocorrerá em três dimensões.
- Verificação da condição dos sócios ou associados do EES. Consiste em examinar se os associados ou sócios atuam verdadeiramente como tais ou se prestam serviços sob os requisitos da relação de emprego, com foco na primazia da realidade sobre a forma, como ocorre em casos de societização compulsória.[4]
- Fiscalização da mão de obra contratada pelo EES. Consiste em examinar se os agentes contratados pelos EESs são genuinamente autônomos, CNPejotizados (MEIs),[5] pejotizados, ou autênticos empregados sem registro na presença dos requisitos da relação de emprego; e
- Verificação da natureza jurídica do empreendimento de economia solidária. Trata-se de verificar se está o ESS formalmente constituído como uma das espécies de pessoas jurídicas do artigo 44 do Código Civil ou se, por falta do registro atributivo de personalidade jurídica a que se refere o artigo 45 do Código Civil, a hipóteses configura sociedade em comum (coletivo informal) dos artigos 986 a 990 do mesmo diploma.
Assim, a fiscalização trabalhista adequada dos EESs é essencial para garantir que os benefícios da política sejam efetivamente direcionados às iniciativas que promovam os valores almejados. A lei também incentiva a regularização jurídica para retirar dos grupos da informalidade, promovendo a inserção no regime legal associativo e fortalecendo a economia solidária no país.
[1] Anotou Paul Singer: “Escrevemos no item 1 do primeiro capítulo deste livro que a cooperativa de produção é o protótipo de empresa solidária”. (Introdução à economia solidária. 1ª ed. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2002, p. 90). Disponível em https://fpabramo.org.br/wp-content/uploads/2018/04/Introducao-economia-solidaria-WEB-1.pdf Acesso em 25 mar 2025)
[2] Entrevista concedida ao CanalGov em 28.09.2015. Disponível em
[3] Voto proferido pelo relator, Min. Roberto Barroso, na Reclamação nº 59.836-DF, julgada em 24.05.2023.
[4] A societização ou socialização consiste na prática fraudulenta de exigir que um trabalhador seja formalizado como sócio de uma pessoa jurídica como condição para sua admissão e manutenção no emprego.
[5] O Microempreendedor Individual - MEI, embora possua inscrição no CNPJ, não constitui pessoa jurídica. Por isso não seriam pejotizados, por não formarem pessoa jurídica, dizendo-se então que são “cnpejotizados”. Vide artigo disponível em https://www.migalhas.com.br/depeso/399019/cnpejotizacao-versus-pejotizacao.
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